Prestes a fazer um ano, tragédia de Mariana (MG) inspira livros para crianças
Era 5 de novembro de 2015. Às 16h20, a barragem de Fundão, controlada pela Samarco, empresa cujas donas são a Vale do Rio Doce e a BHP Billiton, se rompeu e despejou 35 milhões de metros cúbicos de lama e rejeitos de mineração no rio Doce. A tsunami devastou o distrito de Bento Rodrigues, que fez parte da Estrada Real no século 17 e hoje pertence ao município de Mariana (MG), deixou 19 pessoas e 11 toneladas de peixes mortos, afetou quase 40 municípios e contaminou uma área de 80 km² de mar, já no Espírito Santo.
Prestes a completar um ano, o maior desastre ambiental da história do Brasil agora vira tema de livros para crianças e adolescentes.
“Nossa intenção era fazer uma obra que não fosse didática ou panfletária, mas abordasse a questão do ponto de vista da literatura, da poesia, do livro ilustrado”, diz a editora Márcia Leite, da Pulo do Gato, que lança na segunda quinzena de outubro o livro “Um Dia, um Rio”. Idealizada por Leite e produzida a três mãos, com o escritor mineiro Leo Cunha e o ilustrador André Neves, a história foge do factual para abordar os acontecimentos de um ponto de vista mais poético.
Em vez de recontar a tragédia e ser um almanaque, com um pé no jornalismo e no documento histórico, a obra dá voz ao rio e à transformação pela qual foi forçado a passar –o que pode servir tanto para o rio Doce quanto para os tantos cursos d’água espalhados pelas grandes cidades, que recebem quantidades grandes de esgoto e se tornam verdadeiros leitos de poluição. E, assim, ajuda a despertar a reflexão no leitor, seja ele criança ou adulto: será que o caso de Mariana não acontece diariamente, em menor escala, bem ao lado de nossas casas?
“Meu leito virou lama, / meu peito, chumbo e cromo, / minhas margens, tristeza. / Eu era doce, / hoje sou amargo.”, escreve Leo Cunha, com a precisão que muitas vezes só a literatura e a arte conseguem ter nos momentos de catástrofe.
Esses e os demais versos são acompanhados pelas delicadas e impactantes ilustrações de André Neves, que originalmente foi convidado para coordenar e dirigir os desenhos e a arte do livro, a ser feita por outro profissional, mas acabou se empolgando com o projeto e ele mesmo ilustrando a obra. Feitas à mão, como se fossem quadros (como o que abre este texto), as ilustrações mudam de tom de acordo com a história –brancas na limpeza do rio, marrons por causa da lama, vermelhas pelo sangue. Os originais serão expostos no lançamento, que deve acontecer no dia 22 de outubro, em São Paulo.
“Um Dia, um Rio”
Autor Leo Cunha
Ilustrador André Neves
Editora Pulo do Gato
Preço ainda não definido
Leitor iniciante + leitura compartilhada
MARIANA PARA ADOLESCENTES
Em junho, outro livro inspirado no desastre foi lançado. “Mariana”, da autora curitibana Ana Rapha Nunes, fala do rompimento da barragem pelos olhos de uma adolescente de 12 anos que tem o mesmo nome da cidade.
A história começou a ser escrita assim que a lama destruiu Bento Rodrigues. “No dia anterior, tinha lançado o meu primeiro livro, ‘A Lua que Eu te Dei’. Quando vi o desastre, decidi que queria escrever sobre aquilo, mostrar para crianças e adolescentes o que aconteceu, mas de uma maneira não muito dura”, diz a escritora.
O livro demorou seis meses para ficar pronto, da escrita e ilustração à revisão e publicação, pela editora InVerso. Devido ao prazo curto, não houve tempo para visitar a cidade e os distritos atingidos. “Fiz muita pesquisa em jornais e no Facebook, colhi diferentes histórias de pessoas que moram lá e contavam suas versões da tragédia.”
Uma delas, usada no livro, é de uma menina que voltou à cidade para buscar seu cachorro, antes que ele fosse soterrado pela lama. “Mas foi difícil escrever enquanto as coisas ainda estavam acontecendo. Por isso, terminei primeiro as outras partes da história e deixei por último os capítulos sobre o rompimento da barragem”, conta Nunes.
“Mariana”
Autora Ana Rapha Nunes
Editora InVerso
Preço R$ 35 (2016; 120 págs.)
Leitor intermediário
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