‘Adolescente está lendo cada vez mais’, diz Thalita Rebouças; leia entrevista com a autora
Os 2 milhões de exemplares vendidos no Brasil e os mais de 20 livros lançados deixaram o mundo da literatura pequeno –e fez Thalita Rebouças invadir o cinema. Já são seis filmes confirmados, todos inspirados em suas obras. “É Fada!”, baseado em “Uma Fada Veio me Visitar”, estreou com a youtuber Kéfera no papel principal. “Fala Sério, Mãe!” deve chegar às telas no início de 2018, com Ingrid Guimarães e Larissa Manoela no elenco.
Mas a autora não deixou a literatura de lado. Ela acaba de lançar “Confissões de um Garoto Tímido, Nerd e (Ligeiramente) Apaixonado”, criado como um desdobramento do também longo título “Confissões de uma Garota Excluída, Mal-Amada e (um pouco) Dramática”, lançado em 2016. No “spin-off”, Davi tenta deixar a timidez de lado e se aventurar pelo campo da astrologia.
“As vendas de direitos dão uma ajudinha no orçamento. Mas, muito antes de fazer filme, eu já estava vivendo de literatura. Da venda de livros mesmo”, diz Rebouças. Por isso, não tem dúvidas de afirmar: “Hoje o adolescente sente vergonha de dizer que não gosta de ler”. “Ele está lendo cada vez”, completa.
Abaixo, ela fala sobre livros, internet e o rótulo “literatura de mulherzinha”. Confira.
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FOLHA – Hoje você vive de literatura?
Thalita Rebouças – Graças a Deus. Vivo não só dos livros, mas do que a literatura me trouxe. Peças, filmes… As vendas de direitos dão uma ajudinha no orçamento. Mas, muito antes de fazer filme, eu já estava vivendo de literatura. Da venda de livros mesmo.
Isso quebra a ideia de que o adolescente não lê no Brasil?
Com certeza. Adolescente está lendo cada vez mais. E as editoras estão oferecendo um catálogo mais diverso. Quando eu entrei na Rocco, por exemplo, eles tinham só os livros do Harry Potter, os de outra autora e os meus. Para esse público, era só isso. Dezessete anos depois, o mercado editorial cresceu, se especializou, descobriu novos autores.
Ler deixou de ser coisa de nerd?
Quando comecei, a coisa que mais ouvia era: “Ler é chato, odeio livros”. Hoje o adolescente sente vergonha de dizer que não gosta de ler.
“Harry Potter” foi o grande responsável por essa mudança. Mostrou que não importa o tamanho da história ou se ela não tem ilustrações –se é boa e bem escrita, vai ser lida. A J.K. Rowling ajudou muitos novos autores a surgirem. Inclusive eu, sou muito grata a ela.
Dá tempo de conhecer os novos autores?
Tento acompanhar os lançamentos, nem sempre dá tempo. Mas já li Paula Pimenta, Laura Conrado… O contato com elas é ótimo. Ser escritora é uma profissão muito solitária.
O livro novo, “Confissões de um Garoto Tímido, Nerd e (Ligeiramente) Apaixonado”, foi uma sugestão dos leitores?
Foi sim. O “Confissões de uma Garota Excluída, Mal-Amada e (um pouco) Dramática” foi o primeiro livro em que falei de verdade sobre bullying. Ele é quase um personagem. O Davi e o Zeca, personagens da história que são amigos da Tetê e tiram essa protagonista do desconforto de encarar uma escola nova, acabaram ganhando o coração dos leitores [no livro, Tetê muda de casa com a família e precisa trocar de colégio, de amigos e superar uma desilusão amorosa]. Todos me pediram uma história sobre os dois.
Achei que seria mais divertido falar do Davi. Gostei de escrever sobre um menino que fala como um velho, tratar de corações partidos. Chorei muito escrevendo.
Quanto tempo demora para escrever um livro como esse, de 304 páginas?
Deu muito trabalho. O Davi sempre amou estrelas e se interessou por astrologia. Por isso ele decide fazer um curso sobre o tema –e eu tive que entrar nesse curso com ele. Pedi a consultoria de uma astróloga, que me ajudou em vários momentos. Perdi as contas de quantas mensagens mandei para ela de madrugada, perguntando o que um canceriano com lua em tal casa faria em determinada situação [risos].
Ela chegou até a fazer o mapa astral do Davi. O que é um pouquinho o meu mapa também, porque nós nascemos no mesmo dia: 10 de novembro. Foi muito interessante construir um personagem sabendo qual é o signo dele, o ascendente, a lua, a casa oito. E, a partir disso, escrever as minhas percepções.
Levei oito ou nove meses no processo de pesquisar, escrever, revisar. Foi um dos mais demorados.
Decidiu tratar desses assuntos porque astrologia está na moda?
Adolescente ama signo. Pensei: as meninas vão pirar se eu falar disso. Quando perguntei nas redes sociais sobre o que elas achavam… Nossa!
Como é essa interação com os leitores pela internet?
Eu e a internet nos damos superbem. Faz muita gente se aproximar de mim, conhecer os meus livros. Na época do livro da Tetê, pedi no Snapchat histórias de bullying. Foram mais de 5.000 relatos. Eu mesma leio e respondo tudo.
É possível ser escritor sem ser ativo nas redes sociais?
Claro. Mas é muito natural para mim. Estou conectada desde o começo. A facilidade de conversar com o leitor que mora no Maranhão, por exemplo, é fascinante.
Mas tem a questão do seu público também. Você está na internet porque o adolescente está 100% do tempo lá.
Exatamente. Não dá para estar off-line. O doido é que muitas leitoras que falam comigo pelas redes sociais ficam tão nervosas quando me encontram pessoalmente que ficam completamente mudas. Aí chegam em casa e me mandam um textão pelo computador ou pelo celular.
Após 17 anos de carreira, os seus primeiros leitores já são adultos, talvez muitos até tenham filhos. Por que seus livros não envelheceram com eles? Por que continuar escrevendo para adolescentes?
Acho que tenho 14 anos de maturidade [risos]. Certa vez, fiz um evento com a Ruth Rocha em São Paulo e perguntaram por que ela escrevia só para crianças. A resposta foi: “Porque, para mim, não faz sentido se não for para crianças ”. É lindo. E eu tenho isso com os adolescentes. Sei que eles estão crescendo, envelhecendo, procurando outras coisas. Mas acho incrível fazer parte de uma fase da vida tão complicada, que é a adolescência. Realmente não consigo pensar em histórias que não sejam para eles.
É para essa menina de 14 anos que você escreve?
Sempre penso nessa adolescente que mora em mim. Digo que essa menina de 14 anos escreve, e a jornalista de 42 anos revisa.
Na última Bienal do Livro de São Paulo, a escritora Marian Keyes, autora de “Melancia”, reclamou do rótulo “chick lit” [algo como “literatura de mulherzinha”] que é dado para os seus livros. Suas histórias também são classificados assim?
Não gosto desse rótulo. Faço livros para quem gosta de se divertir. Por que as meninas leem a vida inteira obras como “Menino Maluquinho”, “Marcelo Marmelo Martelo” e “Harry Potter”, mas não têm nenhum preconceito? Ninguém diz que o Ziraldo só faz livros para meninos. Mas adoram dizer que os meus são para garotas. É um machismo de berço, que faz meninos dificilmente passarem a barreira da capa. Só que, quando isso acontece, eles amam a história.
Espero sinceramente que essa barreira de gênero seja quebrada. Na verdade, acho que já está sendo. Da mesma forma que vi a galera começar a tomar gosto pela leitura, espero viver para acompanhar esse rótulo de “literatura de menina” desaparecer.
“Confissões de um Garoto Tímido, Nerd e (Ligeiramente) Apaixonado”
Autora Thalita Rebouças
Editora Arqueiro
Preço R$ 34,90 (2017; 304 págs.)
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